A responsabilidade civil impõe que toda a pessoa natural ou jurídica que, por ato ilícito, causar dano a outra, ficará obrigada a repará-lo por meio de indenização, nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil.
O Fisco, em sua atividade de controle do ingresso de mercadorias estrangeiras ao País, poderá ser civilmente responsabilizado caso cometa ilegalidades e abusividades em sua atividade, e cause danos de natureza patrimonial aos importadores, conforme o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal de 1988.
Nos termos do citado dispositivo constitucional, a responsabilidade civil do Fisco em sua atividade é objetiva, ou seja, não existe necessidade de comprovação de dolo ou culpa em sua conduta, sendo excluída a responsabilidade civil do ente estatal apenas nos casos de culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior.
Para que o Fisco tenha a obrigação de indenizar, é necessária a coexistência de três requisitos: a) o ato ilícito, ativo ou omissivo, praticado pela autoridade aduaneira; b) o dano patrimonial causado ao importador; c) o nexo de causalidade entre o ato ilícito da autoridade fiscal e o dano.
Muito embora, conforme o artigo 237 da Constituição, o Fisco tenha a prerrogativa de exercer a fiscalização do comércio exterior, para proteger o interesse público, sobretudo a arrecadação dos tributos e a indústria nacional, essa atribuição deve ser ponderada com as garantias individuais dos importadores, tais como a legalidade (artigos 5º, inciso II, e 37, caput, da Carta Constitucional), a livre iniciativa (artigos 1º, inciso IV, e 170, caput, da Carta Magna), o devido processo legal e a ampla defesa e contraditório (artigo 5º, incisos LIV e LV, da Carta Política).
No caso concreto, conforme a jurisprudência pacífica do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o Fisco estará cometendo ilegalidade caso ultrapasse o prazo de oito dias para concluir a conferência aduaneira de bens e documentos, por aplicação analógica do artigo 4º do Decreto nº 70.235, de 1972, que foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988 como lei ordinária, e que regulamenta o processo administrativo fiscal na esfera federal.
Também o Fisco estará agindo de forma arbitrária se reter as mercadorias importadas quando não existentes indícios de infração punível com a pena de perdimento. Neste caso, a autoridade estará afrontando o disposto no artigo 68 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001.
Nas situações supramencionadas, são evidentes os prejuízos sofridos pelos importadores, uma vez que, além de estarem privados do uso dos bens retidos em suas atividades, também estarão arcando com custos decorrentes da permanência dos produtos nos recintos alfandegados, tais como as despesas com armazenagem e demurrage.
Sendo assim, diante da ocorrência de atos ilegais na atividade de fiscalização da autoridade aduaneira, que causem prejuízos aos importadores, cabível a indenização pelos danos patrimoniais sofridos em decorrência das taxas de armazenagem e demurrage suportadas no curso da operação de importação e ainda os lucros cessantes pelo que as empresas deixaram lucrar em virtude da retenção de seus produtos no recinto alfandegado.
Contudo, caso exista regularidade no procedimento fiscal de retenção das mercadorias, por existência de indícios de infração punível com a pena de perdimento, ou ainda, por exigência de reclassificação fiscal, a indenização aos importadores não é devida, uma vez que nestes casos o Fisco estará agindo dentro de seu poder de polícia de controle do ingresso de mercadorias estrangeiras.
Portanto, para se verificar a obrigação do Fisco de indenizar os importadores em virtude de retenções de mercadorias, deverá ser analisado caso a caso se houve arbitrariedades da autoridade aduaneira no curso do procedimento de importação.
Conforme entendimento jurisprudencial, em caso de abusos da autoridade aduaneira na sua atividade fiscalizatória, interferindo indevidamente na esfera patrimonial dos importadores, estes poderão buscar judicialmente a reparação pelos prejuízos sofridos.
Gabriel Sant’Ana Bitencourt Dias
Advogado adjunto da Veppo Advogados Associados S/S, formado em Direito pelo Centro Universitário Ritter dos Reis – Campus Canoas, e pós-graduado em Direito Tributário pela mesma instituição.